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Foto do escritorLury Tomioka

Para além do conhecido

Talvez você tenha uma lista de circunstâncias que tiram a sua paz. Eu entendo... porém, preciso dividir isto com você, sem sutilezas: não é Deus, a vida, a economia, o presidente do país, a sua família, as outras pessoas ou os astros que te fazem sofrer, são as suas próprias memórias ou imaginações.


Muito provavelmente, assim como eu, você não nasceu num lar harmonioso, com as condições emocionais saudáveis – desde o momento em que você estava no útero da sua mãe – para ser quem você é no mundo sem tantos conflitos. Ou, talvez você diga "Eu tive uma infância feliz!", embora tenha percebido na vida adulta que alguns eventos lá de trás deixaram marcas significativas e duradouras no seu mundo interno. De qualquer forma, fazemos parte do clube da humanidade e, aqui na Terra, desde pequenos somos atravessados por traumas.


A questão é: o que fazemos com as nossas partes em dor? Quando elas não são vistas, ficamos congelados no passado. Apesar das nossas tentativas de deixar as feridas emocionais “para trás” e manter tudo “sob controle”, as memórias carregadas de medo e vergonha, armazenadas principalmente durante a infância, são acionadas o tempo inteiro e conduzem as nossas vidas – ainda que não tenhamos consciência disso. A partir desses estados emocionais, também ficamos condicionados ao futuro, com a mente ocupada na elaboração de cenários catastróficos e narrativas extremamente limitantes.


Sofremos, porque nos mantemos agarrados a memórias e imaginações que não refletem a verdade sobre quem somos aqui e agora.

Claro que ninguém quer sofrer! O problema é que o nosso cérebro adora pilotos automáticos: até que possamos de fato experimentar novas possibilidades de sentir, pensar e agir, ficamos fixados em estados emocionais e mentais dolorosos, porque pelo menos eles constituem um repertório familiar. Assim, fazemos as mesmas escolhas, ativamos os mesmos circuitos neurais, manifestamos as mesmas experiências, vivenciamos as mesmas emoções passadas... e seguimos culpando o mundo externo por tirar a nossa paz! Até certo ponto, é confortável.


Quem nunca permaneceu num relacionamento tóxico, ou num trabalho profundamente desestimulante, só porque era o conhecido? Achamos melhor não trocar o “certo” pelo duvidoso, ainda que o "certo" seja muito ruim! Ou seja, em vez de despertar a nossa incrível capacidade de cura e o nosso potencial criativo para gerar experiências mais benéficas, seguimos prevendo e construindo o futuro de acordo com a antiga coletânea de memórias, emoções e pensamentos negativos.


Acontece que tudo o que nos deixa seguros demais acaba nos aprisionando... chega uma hora em que a zona de conforto começa a ficar desconfortável, porque a nossa essência busca pela expansão ilimitada e não por pilotos automáticos.



Acomodar-se no conhecido e nos limites que demarcamos para nós mesmos é lutar contra a única certeza da vida: transformação contínua.

Cada um tem seu tempo e a sua própria jornada de libertação, mas assim como a flor que nasce do concreto nas ruas, a sua natureza também quer brotar, com toda a sua potencialidade e esplendor – por mais desafiantes que tenham sido ou ainda sejam as circunstâncias ao seu redor.


Que tenhamos coragem e compaixão para olhar para dentro, acolher as nossas partes em dor e reconhecer que não somos prisioneiros da infância, das nossas memórias ou imaginações baseadas no passado. Somos livres para criar o inédito nas nossas vidas.

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